Funcionários da Casa do Ancião condenados por se apropriarem de dinheiro de idosos têm penas reduzidas

LEIA A ÍNTEGRA DA DECISÃO.

Publicada em 16 de April de 2014 às 14:16:00

Dois servidores públicos  - Patrícia Aparecida Mageski  e Mário Carneiro de Oliveira - acusados de subtrair dinheiro de idosos da Casa do Ancião, em Porto Velho, tiveram a dosimetria da pena revista parcialmente por maioria de votos dos membros da 1ª Câmara Especial do Tribunal de Justiça de Rondônia, em sessão de julgamento realizada dia 03 deste mês de abril. Uma terceira pessoa - Daniela Pereira Braga -, também envolvida no caso, teve a pena da primeira instância mantida, nos termos do voto do relator, desembargador Oudivanil de Marins.

O primeiro réu, condenado a 10 anos, 01 mês e 10 dias, em primeira instância, a cumprir pena em regime fechado, teve a penalidade revista para 5 anos, 5 meses e 3 dias, em regime semiaberto; já a segunda ré, condenada pelo juiz singular a 5 anos, 5 meses e 10 dias, mais a perda da função pública, no 1º grau, teve a pena reformada para 3 anos, 1 mês e 3 dias. Esta pena foi substituída por duas restritivas de liberdade, além disso teve também afastada a decretação da perda da função pública por maioria de votos dos membros da 1ª Câmara Especial.

De acordo com o voto do desembargador Eurico Montenegro Júnior, presidente da 1ª Câmara Especial e decano do Tribunal de Justiça de Rondônia, sua decisão corrige a pena quanto à continuidade delitiva para afastar a condenação do primeiro e segundo réus penalizados pelo delito descrito no artigo 106 da lei 10471/2003 (crime contra idoso) no primeiro grau.

Para o voto divergente, o artigo 106 do Estatuto do Idoso é absorvido, no caso, pelo artigo 312 do Código Penal, cuja pena máxima é de 12 anos; enquanto a máxima do Estatuto do Idoso é de 4 anos. “Com relação ao crime continuado, o juiz fixou a pena base de cada um dos delitos, fazendo incidir sobre cada um a majorante do artigo 71 do CP, quando deve ser aplicada a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada em qualquer caso de um sexto a dois terços”.


Crimes praticados pelos réus
Os três réus condenados são acusados pela prática da subtração de valores monetários de aposentadoria, assim como movimentação de contas corrente e poupanças de idosos da Casa do Ancião, em Porto Velho. Esse delito, segundo a decisão judicial, ocorreu entre os meses de dezembro de 2010 e maio de 2011.


ÍNTEGRA DA DECISÃO


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA
Tribunal de Justiça
1ª Câmara Especial

Data de distribuição :28/10/2013
Data de julgamento :03/04/2014


0014126-38.2011.8.22.0501 Apelação
Origem : 0014126-38.2011.8.22.0501Porto Velho/RO (2ª Vara Criminal)
Apelante : Daniela Pereira Braga
Advogados : Trumans Assunção Godinho (OAB/RO 1.979),
José Teixeira Vilela Neto (OAB/RO 4.990) e
Amanda Alves Paes (OAB/RO 3.625)
Apelante : Mário Carneiro de Oliveira
Advogados : Francisco Nunes Neto (OAB/RO 158) e
Sérgio Marcelo Cardoso de Freitas (OAB/AC 1.855)
Apelante : Patrícia Aparecida Mageski
Advogados : Francisco Nunes Neto (OAB/RO 158)
José Bruno Ceconello (OAB/RO 1.855)
Apelado : Ministério Público do Estado de Rondônia
Relator : Desembargador OUDIVANIL DE MARINS
Revisor : Desembargador Eurico Montenegro

EMENTA

Apelação. Criminal. Peculato. Crime contra idoso. Crime maior absorve crime menor. Ocorrência única. Réus. Corréus.


Quando praticados dois ou mais crimes da mesma espécie, a aplicação da pena deverá ser a de um só dos crimes (se idênticas) ou a mais grave (se diversas), aumentada em qualquer caso de um sexto a dois terços.

Praticado o crime de peculato de forma contínua, tendo em conta o art. 71 do CP, deve se manter a sua pena-base, majorada em quatro meses quando cometido contra idoso, aumentando ainda em 2/3, em razão do número de fatos.

Presente o redimensionamento das penas imputadas ao réu surge o imediato e automático reflexo ao corréu.

A pena de perda do cargo público é acessória e deve ser afastada quando da ocorrência do redimensionamento da pena em recurso.

A tese do desconhecimento de ilicitude do fato não merece guarida quando presente a apropriação indébita praticada por servidor público, uma vez que, é detentor de conhecimento, além do homem médio, sabedor e consciente da ilicitude da conduta perpetrada, pois advinda do seu mister.




ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da 1ª Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, em, POR UNANIMIDADE, REJEITAR A PRELIMINAR. NO MÉRITO, POR MAIORIA, Dar PROVIMENTO PARCIAL AOS RECURSOS DE MÁRIO CARNEIRO DE OLIVEIRA E DE PATRÍCIA APARECIDA MAGESKI. VENCIDO EM PARTE O RELATOR QUANTO À FIXAÇÃO DA PENA. POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DE DANIELA PEREIRA BRAGA NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

Os Desembargadores Eurico Montenegro e Gilberto Barbosa acompanharam o voto do relator na preliminar. No mérito divergiram do relator somente quanto à fixação da pena dos apelantes Mário Carneiro de Oliveira e Patrícia Aparecida Mageski.

Porto Velho, 3 de abril de 2014.


DESEMBARGADOR OUDIVANIL DE MARINS
RELATOR


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA
Tribunal de Justiça
1ª Câmara Especial

Data de distribuição :28/10/2013
Data de julgamento :03/04/2014


0014126-38.2011.8.22.0501 Apelação
Origem : 0014126-38.2011.8.22.0501Porto Velho/RO (2ª Vara Criminal)
Apelante : Daniela Pereira Braga
Advogados : Trumans Assunção Godinho (OAB/RO 1.979),
José Teixeira Vilela Neto (OAB/RO 4.990) e
Amanda Alves Paes (OAB/RO 3.625)
Apelante : Mário Carneiro de Oliveira
Advogados : Francisco Nunes Neto (OAB/RO 158) e
Sérgio Marcelo Cardoso de Freitas (OAB/AC 1.855)
Apelante : Patrícia Aparecida Mageski
Advogados : Francisco Nunes Neto (OAB/RO 158)
José Bruno Ceconello (OAB/RO 1.855)
Apelado : Ministério Público do Estado de Rondônia
Relator : Desembargador OUDIVANIL DE MARINS
Revisor : Desembargador Eurico Montenegro



RELATÓRIO

Trata-se de apelações criminais interpostas por Mário Carneiro de Oliveira, Patrícia Aparecida Mageski e Daniela Pereira Braga contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Criminal desta comarca, o qual os condenou pela prática dos seguintes fatos assim descritos na inicial:

1º FATO:

Consta que os denunciados Mário Carneiro de Oliveira e Patrícia Aparecida Mageski, os quais inclusive convivem em união estável, valendo-se das facilidades da condição de servidores públicos estaduais, lotados na Casa do Ancião deste Estado, em razão dos respectivos cargos de Assistente Social e de Técnica em Enfermagem que exerciam no referido abrigo estadual, em unidades de desígnios, nesta cidade, subtraíram, para si, mensalmente, no período de dezembro de 2010 a maio de 2011, rendimentos do idoso Elmer Egon Schmidtke, então com 80 (oitenta anos de idade)
Segundo o apurado nos autos, para fins de ocultar a apropriação dos rendimentos da vítima supracitada, os denunciados Mário e Patrícia, de forma irregular e fraudulenta, no dia 29.01.2011, retiraram o idoso Elmer, da Casa do Ancião, instituição pública, sem custo para o abrigado, levando-o para o Lar Espírita da Terceira Idade André Luiz LEAL, instituição privada, com custo para o abrigado. Na casa de abrigamento LEAL, apresentando-se como Assistente Social da Casa do Ancião, na tentativa de encobrir as apropriações dos rendimentos das vítimas, o denunciado Mário disse que os documentos do idoso Elmer estavam em posse de uma neta deste, do interior, a qual, inclusive, segundo o denunciado, era a pessoa responsável pelo recebimento dos rendimentos do idoso. Entretanto, elucidou-se nos autos que a referida neta jamais existiu e que os documentos da vítima Elmer, inclusive o cartão do benefício do INSS e cartão bancário, ambos com senha, além de documentos relacionados a uma fazenda em ariquemes, estavam em posse dos denunciados Mário e Patrícia.
Esclareceu-se, ainda, que o denunciado Mário, no dia 08/12/2010, levou o idoso ao cartório de registros e o fez lavrar procuração em seu favor, de modo a facilitar ainda mais as práticas delituosas.
Assim, agindo mês a mês, ora o denunciado Mário, ora a denunciada Patrícia, de posse dos cartões e senhas, efetuavam saques das contas corrente e poupança da vítima Elmer, subtraindo parte dos valores retirados, pois chamado a prestar contas da administração dos rendimentos deste idoso, os denunciados não apresentaram documentos que comprovassem a integral destinação dos rendimentos em favor da vítima.
Consta dos autos que, no mês de março de 2011, nesta cidade, após efetuar a retirada de dinheiro de uma das contas do idoso Elmer Ergon Shmidtke, o denunciado Mário Carneiro de Oliveira subtraiu, para si, o valor de R$ 4.832,00 (Quatro mil, oitocentos e trinta e dois reais), de propriedade desta vítima.

2º FATO:

Chamado a prestar constas na Promotoria de Justiça do Idoso da Capital, no dia 16.05.2011, na tentativa de encobrir o delito descrito acima, o denunciado Mário não apenas falsificou como também apresentou um falso recibo, onde consta que teria repassado o valor de R$ 4.832,00 (Quatro mil, oitocentos e trinta e dois reais) a uma suposta neta do idoso, pessoa esta que se revelou fictícia, após diligência da Promotoria de Justiça de Vilhena.
Averiguou-se, inclusive, que o CPF constante no falso recibo pertence a outra pessoa. Além de ser beneficiário do INSS, há informações nos autos de que a vítima Elmer recebe mensalmente uma indenização da CAERD, havendo, ainda documentos sobre uma possível fazenda em Ariquemes.

3º FATO:

Consta que os denunciados Mário Carneiro de Oliveira e Patrícia Aparecida Mageski, também valendo-se das facilidades da condição de servidores públicos estaduais, lotados na Casa do Ancião deste Estado, em razão dos respectivos cargos de Assistente Social e de Técnica em Enfermagem que exerciam no referido abrigo estadual, em unidade de desígnios, nesta cidade, subtraíram para si, mensalmente, no período de dezembro de 2010 a agosto de 2011, os rendimento do abrigado idoso Antônio Remundo, então com 87 (oitenta e sete) anos de idade.
Apurou-se nos autos que, de posse do cartão de benefício e senha da vítima Antônio Remundo, mês a mês, ora o denunciado Mário ora a denunciada Patrícia efetuavam saques e subtraíam o dinheiro pertencente a este idoso, dando, portanto, a estes rendimentos destinação diversa do interesse desta vítima. Na tentativa de ocultar os delitos, o denunciado Mário disse que repassava os valores sacados a uma terceira pessoa quem devia à vítima e não o contrário, conforme comprova o Termo de Acordo realizado nos autos do Processo Penal nº 000976949.2010.8.22.0501, da 1ª Vara Criminal de Porto Velho/RO. Ainda na tentativa de encobrir as subtrações, o denunciado Mário omitia que ele e sua companheira estavam na posse dos documentos e cartão de benefício desta vítima, atribuindo-a a terceira pessoa.

4º FATO

Apurou-se também que, no dia 1º de agosto de 2011, na Casa do Ancião, nesta cidade, a denunciada Daniela Pereira Braga, na condição de Diretora de Instituição Estadual de abrigamento, apropriou-se da quantia de R$ 2.720,00 (dois mil, setecentos e vinte reais), pertencente à abrigada idosa Geracilda Peixoto Silva, valor este que estava confiado à guarda e posse desta referida denunciada.

As razões recursais de Mário Carneiro de Oliveira e Patrícia Aparecida Mageski inicialmente aduzem o fato de que a recorrente nunca prestou qualquer tipo de serviços na Casa do Ancião, somente seu companheiro (Mário) exercia a função de Assistente Social.

Sobre os fatos imputados alegam que ficou comprovada a inexistência da subtração de valores das contas do idoso Sr. Elmer Egon Schmidtke (1º fato), pois os extratos bancários de fls. 417-483 provaram o contrário das acusações do Ministério Público.

Quanto ao 2º fato (falsificação de documentos) a razão também, a seu ver, não assiste ao representante do MP, pois a apresentação de contas alegadas na denúncia existiu e a documentação apresentada, às fls. 130-515, não foi analisada pelo Juízo sentenciante.

Sobre a transferência do idoso Sr. Elmer aduz o recorrente Mário que providenciou a remoção do ancião para uma instituição particular (Casa André Luiz) pelo fato da existência de constantes agressões entre idosos e até mesmo a grave ocorrência de um assassinato de um idoso cometido por outro.

Informa o aparecimento de uma suposta neta (senhora Rosa Marques Shmidtke) do idoso na instituição de abrigo, apresentando documentos, endereço e na posse dos cartões e documentos do ancião, entregando-os ao recorrente no fim do mês de novembro de 2010.

Acerca das procurações alegam que eram realizadas por meio de laudos confeccionados pelo médico e pela geriatra da Casa do Ancião, sendo que um funcionário do Cartório Carvajal foi até o local para lavrar a procuração, prática muito comum na instituição, uma vez que a instituição detinha em seu poder procurações de vários idosos, sendo estes que escolhiam o funcionário com mais afinidade para tratar de seus assuntos.

Repisam o fato de estar comprovado nos autos que os valores provenientes da indenização que o idoso Sr. Elmer recebe da CAERD e o seu benefício do INSS foram usados apenas em seu proveito, quer seja na própria manutenção das necessidades básicas do ancião quer seja no pagamento de algumas dívidas. Assim, asseveram que os recursos financeiros foram utilizados de forma legítima e com autorização do idoso, razão pela qual não há falar na prática dos crimes que geraram a condenação.

Por derradeiro, os recorrentes informam a entrega de toda a documentação do ancião - juntamente com seus cartões bancários - à Promotoria, fatos que, sob sua ótica, os eximem de toda responsabilidade penal e administrativa.

Sobre o 3º fato (subtração de proventos do idoso Sr. Antônio Remundo) aduzem que nenhuma acusação paira sobre eles, para corroborar tal levante apontam trechos colhidos no depoimento do próprio ancião tomado às fls. 66-67, transcrevo:

[¿] quem está recebendo meu benefício atualmente é Diretor da Casa do Ancião chamada Lurdes [...];

[...] eu morava com o Senhor Jair numa chácara no Distrito de Abunã [...] era o Jair que recebia minha aposentadoria [...];

[...] fiquei sabendo que o Jair estava ¿pegando¿ o meu dinheiro, pois não via o dinheiro da minha aposentadoria [...].

Por fim, alegam que o depoimento da Sr. Jair (fls. 68-69) confirma o depoimento do idoso Sr. Antônio e que a Diretora da Casa do Ancião Daniela Pereira Braga detinha todo o controle do que acontecia com os idosos dentro e fora da instituição, inclusive era guardiã de valores e documentos dos anciãos.

Também apela Daniela Aparecida Braga, Diretora da Casa do Ancião, à época dos fatos, e condenada por ter, supostamente, apropriado-se da quantia de R$ 2.720,00 (dois mil, setecentos e vinte reais) pertencente à abrigada idosa Geracilda Peixoto Silva (4º fato), valor este que estava confiado à sua guarda e posse.

Recorre sob a alegação de que em nenhum momento agiu com dolo, o qual é elemento subjetivo do tipo penal, manifestado na vontade livre e consciente do agente no sentido de apossar-se definitivamente do bem em benefício próprio ou de terceiro, sendo que para a configuração do delito deve se fazer presente a violação do dever de fidelidade do funcionário público à administração pública, o que não presente caso, sob sua ótica, não houve.

Aduz que seu depoimento não pode ser entendido como confissão, mas, sim, como reconhecimento do cometimento de ato sem a consciência necessária e conhecimento de sua ilicitude, ou seja, não entendia como um possível crime e diante da equivocada apreciação dos fatos e errônea compreensão do direito faz-se presente o erro do tipo, e quando teve essa noção do certo providenciou a devolução dos valores.

Ademais, alega que em nenhum momento foi atrás da suposta vítima para se apossar de bens, valores ou documentos, como fizeram os corréus, pois o montante lhe foi entregue de forma espontânea pela idosa Srª Geracilda e em um momento difícil que a instituição estava passando, sem repasses de recursos governamentais utilizou-se do dinheiro em prol da instituição, para tanto apresentou prestação de contas.

Por derradeiro, aduz que em nenhum momento está caracterizada a intenção de apropriar-se definitivamente do bem, visto que providenciou a devolução do dinheiro com a devida prestação de contas, fatos que, mesmo após o oferecimento da denúncia, demonstram a não intenção de ficar em definitivo com os valores entregues aos seus cuidados, além do fato de terem sidos utilizados pelo bem da suposta vítima e outros idosos.

Esses foram os apelos de Mário Carneiro de Oliveira, Patrícia Aparecida Mageski (fls.533-538) e Daniela Pereira Braga (fls. 566-573), pugnando por suas absolvições.

As contrarrazões ofertadas pelo Ministério Público impugnam em sede preliminar as declarações juntadas com a apelação de fls. 533-538, sob a alegação de que não foram prestadas na oportunidade devida, tendo por consequência a ausência do crivo do juízo sentenciante e o contraditório, pois os declarantes foram arrolados como testemunhas da defesa e mesmo intimados a prestarem seus depoimentos diante do juízo de origem não compareceram à oitiva. Requer ainda o encaminhamento da cópia integral dos autos ao Ministério Público para que sejam tomadas as medidas necessárias em relação à falsidade das declarações prestadas.

No mérito, roga pela confirmação da sentença penal condenatória (fls. 578-600).

A Procuradoria de Justiça, por meio do parecer lavrado pelo Procurador Osvaldo Luiz Araújo, opina pelo desprovimento dos recursos (fls. 602-608).

É o relatório.


VOTO

DESEMBARGADOR OUDIVANIL DE MARINS

I. Das preliminares

I.I. Do vínculo da apelante Patrícia Aparecida Mageski com a instituição ¿Casa do Ancião¿

Embora a recorrente Patrícia Aparecida Mageski não tenha arguido, de forma expressa, como preliminar o fato de não ter nenhum vínculo com a instituição "Casa do Ancião", entendo a situação como tal e passo à análise preambular ao mérito do apelo.

Dos autos extrai-se que a corré Patrícia realmente nunca teve vínculo com a instituição ¿Casa do Ancião¿ e, apesar de ser servidora pública do quadro efetivo da Secretaria Estadual de Saúde (SESAU), exercente do cargo de Técnica em Enfermagem, lotada no Hospital de Base em Porto Velho, não exerceu tais atividades naquele asilo e, embora a sentença, equivocadamente, a tenha vinculado àquele abrigo, isso pouco influi no resultado da decisão, pois até mesmo o particular comete o crime de ¿peculato¿ quando há concurso de agentes, é o que se extrai do art. 29 do Código Penal.

Sobre o tema em sua interpretação do Código Penal Alberto Silva Franco faz a seguinte observação no que tange ao sujeito ativo do crime de peculato:

Agente ou sujeito ativo do crime é o funcionário sobre o qual se discorreu no estudo do art. 327. Pode também ser o particular, quando houver concurso de agentes. Cometerá ele peculato, ex vi do art. 26 (atual art. 30): ¿Dada a identidade de crime para todos os concorrentes, deduz-se que cada um deles deve responder igualmente pelo mesmo título de delito. Em outros termos, reconhecido o caráter unitário do crime cometido com a participação de várias pessoas, resulta que todos necessariamente respondem pelo mesmo delito¿ (Reccio) (cf. Magalhães Noronha, Código Penal, 8ª ed., vol. 4º/233, Saraiva, 1976; idem Nélson Hungria, Comentários ao Código Penal, vol. IX/339, Forense, 1958).

Portanto, pouco importa se a apelante era ou não servidora lotada na ¿Casa do Ancião¿, os fatos que estão lhe sendo imputados serão analisados sob o prisma do art. 327 do Código Penal, em razão do concurso de agentes.

I.II Apresentação de documentos novos com o apelo fls. 540-547 e 561-564

O Ministério Público impugna as declarações e documentos vindos em anexo ao recurso de apelação do casal Mário e Patrícia, uma vez que não foram prestadas ao tempo certo da marcha processual, não passando assim pela análise do juízo sentenciante. Ressalta ainda o fato que dois dos declarantes foram intimados como testemunhas de defesa e não compareceram à oitiva.

Pois bem. Os apelantes Mário e Patrícia juntaram três declarações e alguns documentos com as razões do apelo, a fim de demonstrar sua idoneidade e zelo como profissionais, além de situação familiar e financeira.

No entanto, verifico que as declarações e documentos juntados são posteriores à prolação da r. sentença, ocorrida em 30 de setembro de 2009 (fls. 518-523).

Estas declarações e quaisquer outros documentos deveriam ter sido apresentados à apreciação e consideração do juízo a quo, cuja sonegação ao seu conhecimento e sentença redunda em evidente supressão de instância, razão por que, consoante emerge claro do teor dos arts. 396, 397 e 517 do CPC, inadmite-se que sejam conhecidos.

Confira-se, a respeito, os seguintes arestos do Superior Tribunal de Justiça:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. ISS. SERVIÇOS DE HOTELARIA. DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO. AUSÊNCIA DE JUNTADA. ARTS. 283, 333, INCISO I E 396 DO CPC. COMPROVAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE FORÇA MAIOR. ART. 517 DO CPC. SÚMULA Nº 07/STJ. REEXAME DE FATOS E PROVAS. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS Nºs 282 E 356/STF. I - Na interpretação aos arts. 283, 333, inciso I e 396 do CPC depreende-se que é exigida a juntada dos documentos indispensáveis à prova dos fatos constitutivos do autor, quando do ajuizamento de sua ação, sendo somente permitida a exibição posterior quando se tratar dos demais documentos, não fundamentais à demanda. Precedentes: Resp nº 518.303/AL, Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA, DJ de 22/03/04; REsp nº 431.716/PB, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJ de 19/12/02; e REsp nº 71.813/RJ, Rel. Min. PAULO COSTA LEITE, DJ de 20/05/96. II - In casu, a recorrente deixou de acostar, nos embargos à execução, documentos essenciais à lide, a fim de afastar a incidência tributária sobre a sua atividade e, com isso, desconstituir o crédito tributário. III - Ademais, para fins de aplicação do art. 517 do CPC, que permite a suscitação de questões de fato quando da apelação, é incabível a esta Corte a apreciação acerca da ocorrência de força maior, assim como da não-configuração de culpa por parte da recorrente, quanto à não-exibição de tais documentos nos embargos à execução, eis que isso levaria ao reexame fático-probatório dos autos, a teor da Súmula nº 07/STJ. (...),.V - Recurso especial improvido.¿ (RESP 613348/CE; Relator Ministro FRANCISCO FALCÃO; Órgão Julgador PRIMEIRA TURMA; Data do Julgamento 16/11/2004; Data da Publicação/Fonte DJ 13.12.2004; p. 237).

RECURSO ESPECIAL - PROCESSO CIVIL - MANDADO DE SEGURANÇA ¿ LICENÇA PARA CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIO - JUNTADA DE DOCUMENTOS NOVOS ¿ AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA PARTE PARA SE MANIFESTAR - OFENSA AO ART. 398 DO CPC - NULIDADE DO ACÓRDÃO - VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO - RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO PARA DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS À CORTE DE ORIGEM. O recurso merece prosperar pela inequívoca violação ao disposto no artigo 398 do Código de Processo Civil. Com efeito, na hipótese em exame a Corte de origem não deu oportunidade aos impetrantes de se manifestarem acerca da juntada de documentos que se mostraram essenciais para a formação da convicção daquele Tribunal, que, com base neles, deu provimento à apelação da parte contrária. A respeito do tema, pontificam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery que, "após o deferimento de juntada dos documentos nos autos, o juiz deve determinar seja ouvida a parte contrária. Se isto não ocorrer e o documento influir no julgamento do juiz, em sentido contrário ao do interesse da parte preterida, a sentença que vier a ser proferida é nula e assim deve ser declarada". Na espécie, a juntada dos documentos novos foi realizada pelo assistente da parte contrária, o que não afasta a aplicação do artigo 398 do estatuto processual civil, uma vez que a atuação do assistente ocasionou evidente prejuízo à defesa dos recorrentes. Dessarte, verificado na espécie o cerceamento de defesa, pela ausência de oportunidade dada à parte para se pronunciar acerca dos documentos novos trazidos aos autos, resta inafastável a nulidade do acórdão por ofensa ao princípio do contraditório. Recurso especial provido. (RESP 264660/SP; Relator Ministro FRANCIULLI NETTO; Órgão Julgador SEGUNDA TURMA; Data do Julgamento 04/09/2003; Data da Publicação/Fonte DJ 03.11.2003; p. 290).

A admissão das declarações em tal altura da discussão importaria em indubitável supressão de instância e manifesto prejuízo para o apelado. Pelo que deixo de levá-las em consideração para o meu convencimento.

Ressalto, por oportuno, que, a vinda anexa de tais declarações e documentos, apesar de serem posteriores à prolação da r. sentença, não têm o condão de comprovar nenhum fato que possa modificar o convencimento quanto à matéria posta em discussão nestes autos, todos os fatos ali noticiados estão mais que repisados no extenso conjunto fático probatório presente nos autos, não sendo, portanto, essencial para o deslinde da causa.

Quanto à possibilidade da remessa de cópia integral destes autos ao MP para apurar a ocorrência de falsas declarações, entendo descabida em virtude do não conhecimento das mesmas, razão pela qual não se há falar em indícios de falsidade. Outrossim não há impedimento da feitura de cópia integral do presente feito, podendo o Ministério Público fazê-lo a qualquer tempo.

Assim, após análise das preliminares, entendo que deva ser retificada a informação na sentença acerca da não vinculação da apelante Patrícia Aparecida Mageski com a instituição ¿Casa do Ancião¿.

Sobre a apresentação de documentos novos acolho, parcialmente, a preliminar erigida pelo Ministério Público, devendo, tão somente, ser desentranhada do feito em virtude da impossibilidade de seu conhecimento.

Essas são as situações e argumentos preliminares que submeto aos pares.

II. Do Mérito

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos.

Como se vê do relatório, trata-se de apelações criminais ofertadas em razão da r. sentença presente às fls. 518-523, que, nos autos da ação penal em tramitação perante o Juízo da 2ª Vara Criminal desta comarca, julgou procedente a denúncia acerca dos fatos relatados e sentenciou o feito condenando os apelantes na seguintes capitulações:

MÁRIO CARNEIRO DE OLIVEIRA incurso no art. 312, § 1º, por 6 (seis) vezes, na forma do art. 71, c.c os arts. 29 e 61, II, alíneas ¿g¿, ¿h¿ e ¿i¿, todos do Código Penal pela prática do 1º fato; art. 304. c.c o art. 61, II, Alínea ¿b¿, ambos do Código Penal, pela prática do 2º fato; e art. 312, § 1º por 9 (nove) vezes, na forma do art. 71, c.c os arts. 29 e 61, alíneas ¿g¿, ¿h¿ e ¿i¿, todos do Código Penal, pela prática do 3º fato; PENA: 10 ANOS, 1 MÊS E 10 DIAS fechado¿

PATRÍCIA APARECIDA MAGESKI incursa no art. 312, § 1º, por 6 (seis) vezes, na forma do art. 71, c.c os arts. 29 e 61, II, alíneas ¿g¿, ¿h¿ e ¿i¿, todos do Código Penal pela prática do 1º fato; e art. 312, § 1º por 9 (nove) vezes, na forma do art. 71, c.c os arts. 29 e 61, alíneas ¿g¿, ¿h¿ e ¿i¿, todos do Código Penal, pela prática do 3º fato; PENA: 5 ANOS, 5 MESES E 10 DIAS semiaberto¿

DANIELA PEREIRA BRAGA incursa no art. 312, c.c os arts. 61, alíneas ¿g¿, ¿h¿ e ¿i¿, e art. 327, §2º, todos do Código Penal; PENA: 2 ANOS, 8 MESES E 20 DIAS semiaberto - subst. 2 restritivas de direito: prest. serv. comunidade e limit. fim de semana.¿

Inconformados, os réus manejaram recursos de apelação (fls. 533-539 e fls. 566-574 ) em que requerem a reforma da r. sentença, pugnando por suas absolvições.

Devidamente analisadas as pretensões recursais deduzidas nas apelações, frente os fatos em exame e o direito aplicável, decido pelo que se segue:

I. Quanto ao apelante Mário Carneiro de Oliveira

Pesa contra ele sérias acusações concernentes à subtração de valores e proventos dos idosos Elmer Shmidtke e Antônio Remundo (1º e 3º fatos), bem como a falsificação do recibo no valor de R$ 4.832,00 assinado por uma certa Rosa Maria Schmidtke, suposta parente do Sr. Elmer (2º fato) .

Consta dos autos que o apelante tornou-se procurador do Sr. Elmer no dia 08.12.2010 e, desde então, passou a movimentar as contas corrente e poupança do idoso, no período compreendido entre dezembro/2010 a maio/2011, cujos saques chegaram ao montante de R$ 10.120,00 (dez mil cento e vinte reais), não computados os valores do benefício do INSS (fl. 1.106).

Consta também depoimentos do apelante sobre a existência da suposta parente do Sr. Elmer (Rosa), apresentando RG, CPF, endereço residencial e telefone, estando ainda na posse de documentos e cartões do idoso (fl. 126), motivos pelos quais repassou, baseado na boa-fé, a quantia de R$ 4.832,00 (quatro mil, oitocentos e trinta e dois reais) para começar as reformas necessárias em seu imóvel - localizado em Vilhena, para acomodar o idoso.

Aduz o apelante que os documentos concernentes (fls.130-515) à prestação de contas dos valores e proventos do idoso Sr. Elmer durante a vigência da procuração outorgada não foram analisadas pelo juízo sentenciante.

Ocorre que os documentos juntados realmente não precisam de uma análise mais acurada em razão de não possuir nenhum valor probante da inocência dos atos que foram imputados ao apelante. Tratam, em sua maioria, da atuação profissional e vida pessoal do apelante, de resto trazem - a partir da f. 491 - os relatórios sociais dos idosos Elmer e Antônio e fatos exaustivamente repisados na sindicância administrativa e instrução penal.

Sobre os extratos bancários presentes, às fls. 417-483, estes não dizem respeito às contas corrente e poupança do Sr. Elmer, mas, sim, às contas pessoais dos apelantes Mário e Patrícia, portanto, de nenhuma relevância ao resultado do apuratório dos fatos.

Pois bem. Incontroverso que Mário era procurador do Sr. Elmer e movimentou cerca de R$ 10.000,00 (dez mil reais) nas contas corrente e poupança, conforme extratos, às fls. 234-257 do ANEXO VI, além de benefício previdenciário, não conseguindo provar se a totalidade de tais gastos foram em prol do idoso. Verificou-se a omissão do apelante acerca da posse de cartões e documentos pessoais dos idosos Elmer e Antônio e a entrega de falso recibo assinado por pessoa inexistente no intuito de comprovar gastos também fictícios.

Apurou-se, também, de forma incontroversa, a retirada ilegal do idoso sr. Elmer da custódia da "Casa do Ancião", à revelia da direção daquele abrigo, de forma sorrateira e sem registros, com a desculpa de que o estaria levando para a companhia de uma sobrinha fictícia (sindicância fl. 1043 Anexo I). Após, abrigou-o no Lar Espírita André Luiz - LEAL, omitindo no prontuário daquele abrigo o fato de o idoso possuir documentos, benefícios e contas bancárias (testemunho do Diretor do LEAL: Sr. Marcelo - fl. 197 ,ANEXO VI).

Sobre os saques na conta do Sr. Antônio Remundo, o modus operandi foi o mesmo utilizado na movimentação de contas do Sr. Elmer, de posse de procuração realizava saques e não repassava ao idoso. Também omitiu a posse de documentos e a existência de benefício previdenciário.

A alegação do apelante de que parte do benefício era usado para quitar uma dívida com o Sr. Jair Alves Ferreira (fl. 316, Anexo IV) caiu por terra quando se descobriu que a dívida contraída em razão do empréstimo de R$ 1.400,00 (mil e quatrocentos reais) foi feito pelo Sr. Jair em nome do idoso Antônio Remundo para comprar gado, ficando acordado em juízo que este valor seria devolvido ao ancião em 7 parcelas de R$ 200,00 (duzentos reais). Disse ainda nunca ter ido à Casa do Ancião nem ter passado documentos ou qualquer espécie de recibo de valores ao apelante (fl. 1068 - Anexo I).

II. Quanto À apelante Patrícia Aparecida Mageski

Patrícia, por sua vez, embora não sendo lotada na Casa do Ancião teve participação efetiva nos atos perpetrados por seu companheiro Mário, realizando, sem conhecimento da direção do asilo, saques nas contas dos idosos Elmer e Antônio (fl. 1084 - Anexo I), inclusive ajudando na remoção do Sr. Elmer da casa do Ancião para o Lar Espírita André Luiz, todos esses fatos confirmados pela própria apelante e seu companheiro em seus depoimentos, gravados em áudio e vídeo (fl. 93).

A única ressalva necessária é a correção da informação constante na sentença acerca de sua lotação na Casa do Ancião, conforme a preliminar enfrentada.

III. Quanto À apelante Daniela Pereira Braga

Aduz que o dolo é o elemento subjetivo do tipo penal imputado (peculato), o qual é manifestado na vontade livre e consciente do agente no sentido de apossar-se do bem de forma definitiva, sendo que para a configuração do delito é necessário que o funcionário público viole o dever de fidelidade com a administração pública.

Alega que seu depoimento não pode ser interpretado como uma confissão, pois o ato cometido por ela foi sem a consciência necessária e conhecimento de ilicitude, sendo que não entendia e não fazia ideia que poderia ser considerado como um possível crime, tanto é que quando tomou conhecimento da irregularidade reparou o dano imediatamente mediante a devolução integral do montante deixado sob seus cuidados. Alega a presença do erro de tipo.

Pois bem. Como bem salientado na sentença, não se há falar em arrependimento posterior ante a extemporaneidade do ressarcimento, haja vista ter passado recibo à idosa na data de 01/08/2011 (fl. 641 - Anexo III) e vindo a devolver o montante, somente, após o recebimento da denúncia, na data de 17/10/2012 (fl. 25). Portanto, ausente o requisito da voluntariedade, não se configurando a causa especial de diminuição da pena prevista no art. 16 do Código Penal.

Sobre o dolo, entendo mais do que configurada a intenção de se apropriar em razão do tempo para a efetiva devolução (14 meses!), pois, a apelante, ao fim de sua gestão foi chamada ao prestamento de contas, quedando inerte com suas obrigações, enquanto servidora pública, exercente do cargo de Diretora da instituição e guardiã de documentos e valores dos idosos sob sua tutela.

A apelante ainda alega o desconhecimento do ato como ilícito e não possuir consciência necessária acerca do ato, não é crível e não merece guarida a tese do desconhecimento da ilicitude do fato, uma vez que é de conhecimento do homem médio a apropriação indébita de valores, ainda mais sendo servidora pública, pessoa experiente, razão pela qual tinha total condição de ter consciência sobre a ilicitude da conduta perpetrada.

Ante a todo o exposto, dou provimento parcial ao recurso de Patrícia Aparecida Mageski, tão somente para retificar a informação acerca de sua lotação na Casa do Ancião da sentença, que, no entanto, não descaracteriza o tipo, como consta no enfrentamento preliminar. Quanto aos demais apelos sou pelo não provimento dos recursos de Mário Carneiro de Oliveira e Daniela Pereira Braga, mantendo quanto ao mais a bem lançada decisão.

É como voto.

DECLARAÇÃO DE VOTO

Desembargador Eurico Montenegro

Revisei o presente feito e ouvi atentamente o voto do e. relator.

Divirjo parcialmente de seu voto para dar provimento aos recursos de Mário Carneiro de Oliveira e de Patrícia Aparecida Mageski, para correção da pena quanto à continuidade delitiva para afastar, também, a condenação do primeiro pelo delito descrito no art. 106 da Lei n. 10.471/2003 (contra idoso), e da segunda, igualmente, à pena acessória de perda do cargo público em face do redimensionamento da pena.

Com relação à corré Daniela Pereira Braga, acompanho integralmente o voto do relator.

Explico, o porquê.

Da seguinte forma o juiz a quo fixou a pena:

MÁRIO é primário, não registra antecedentes, sua culpabilidade foi inerente aos delitos praticados e as consequências de sua conduta já tipificam os delitos, por estas razões, fixo as penas-bases em 2 (dois) anos de reclusão para cada peculato (seis vezes) referente ao 1º fato; 2 (dois) anos de reclusão para o uso de documento falso; 2 (dois) anos de reclusão para cada peculato referente ao 3º fato (nove vezes) e ainda 2 (dois) anos de reclusão para o delito descrito no art. 106 da Lei n. 10.471/2003.
Deixo de reconhecer as atenuantes em razão das penas terem sido fixadas no mínimo legal.
Considerando que os delitos foram praticados em detrimento de vítimas com idade superior a 60 (sessenta) anos, elevo a pena para 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão para cada peculato referente ao 1º fato (seis vezes), 2 (dois) anos e 4 (quatro) de reclusão para o uso de documento falso, 2 (dois) anos e 4 (quatro) de reclusão para cada peculato referente ao 3º fato (nove vezes), e ainda 2 (dois) anos e 4 (quatro) de reclusão para o delito descrito no art. 106 da Lei n. 10.471/2003.
Considerando que o acusado praticou o mesmo crime, por diversas vezes, em mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, reconheço a continuidade delitiva quanto ao 1º e 3º fatos, aplicando a pena de apenas um dos crimes em cada fato, acrescidas de 1/6 (um sexto), redimensionando as penas do 1º e 3º fatos para 2 (dois) anos e 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão para cada peculato, totalizando para os crimes de peculato a pena de 5 (cinco) anos, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão.
Nos termos do art. 69 do CP, a pena total aplicada ao acusado é de 10 (dez) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão.
Em razão do quantum de pena aplicada, fixo o regime fechado para o início do cumprimento da pena.

Digo, o crime no art. 106 do Estatuto do Idoso (induzir pessoa idosa sem discernimento de seus atos a outorgar procuração para fins de administração de bens ou deles dispor livremente) no caso vertente, é absorvido pelo art. 312 do CP, cuja pena máxima é de 12 anos, enquanto aquele é de 4 anos, anotando-se que neste incidirá a agravante do art. 61, II, letra ¿h¿ (cometido contra idoso), razão por que desde logo afasto a condenação pelo crime do Estatuto dos Idosos aplicada a Mario Carneiro de Oliveira.

Com relação ao crime continuado, ressalto que o juiz a quo fixou a pena-base de cada um dos delitos, fazendo incidir sobre cada um a majorante do art. 71 do CP, quando o certo, segundo o referido dispositivo, é a aplicação da pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada em qualquer caso de um sexto a dois terços.


Assim praticado o crime de peculato de forma contínua, tendo em conta o art. 71 do CP, mantenho a pena-base do crime de peculato imposta pelo sentenciante, ou seja, o mínimo legal de 2 (dois) anos, que majoro em 4 (quatro) meses pela agravante prevista no art. 61, II, letra ¿h¿ (cometido contra idoso), aumentando em 2/3, em razão do número de fatos, ou seja 9 (nove) meses e 3 (três) dias, perfazendo um total de 3 (três) anos, 1 (um) mês e 3 (três) dias.

Mantenho a pena arbitrada no que atine ao uso de documento falso que foi de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses.

Nos termos do art. 69 do CP, somando-se as condenações chega-se a pena final de 5 (cinco) anos, 5 (CINCO) meses e 3 (TRÊS) dias de reclusão, a ser cumprida em regime semiaberto.

Passo agora ao exame da pena de Patrícia, companheira do réu Mário Carneiro, que foi arbitrada pelo julgador de piso da seguinte maneira:

PATRÍCIA é primária, não registra antecedentes, sua culpabilidade foi inerente aos delitos praticados e as consequências de sua conduta já tipificam os delitos, por estas razões, fixo as penas-bases em 2 (dois) anos de reclusão para cada peculato referente ao 1º fato e 2 (dois) anos de reclusão para cada peculato referente ao 3º fato.
Deixo de reconhecer as atenuantes em razão das penas terem sido fixadas no mínimo legal.
Considerando que os delitos foram praticados em detrimento de vítimas com idade superior a 60 (sessenta) anos, elevo a pena para 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão para cada peculato referente ao 1º fato (seis vezes), 2 (dois) anos e 4 (quatro) de reclusão para cada peculato referente ao 3º fato (nove vezes). Considerando que o acusado praticou o mesmo crime, por diversas vezes, em mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, reconheço a continuidade delitiva quanto ao 1º e 3º fatos, aplicando a pena de apenas um dos crimes em cada fato, acrescidas de 1/6 (um sexto) redimensionando as penas do 1º e 3º fatos para 2 (dois) anos e 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão para cada peculato.
Nos termos do art. 69 do CP, a pena total aplicada à acusada é de 5 (cinco) anos, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão. Em razão do quantum de pena aplicada, fixo o regime semiaberto para o início do cumprimento da pena.

Da mesma forma que fez com relação ao corréu Mário, para Patrícia o magistrado fixou a pena-base de cada um dos delitos, fazendo incidir sobre cada um deles a majorante do art. 71 do CP, quando o certo, segundo o referido dispositivo, é aplicação da pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada em qualquer caso de um sexto a dois terços.

Pelas mesmas razões já expostas quanto à Mário, passo a reformular a pena de Patrícia.

Assim, praticado o crime de peculato de forma contínua, tendo em conta o art. 71 do CP, mantenho a pena-base do crime de peculato, imposta pelo sentenciante, ou seja, o mínimo legal de 2 (dois) anos, que majoro em 4 (quatro) meses pela agravante prevista no art. 61, II, letra ¿h¿ (cometido contra idoso), que aumento em 2/3, em razão do número de fatos, ou seja 9 (nove) meses e 3 (três) dias, perfazendo um total de 3 (três) anos, 1 (um) mês e 3 (três) dias a ser cumprida em regime aberto.

Pelo fato de a ré ser primária, substituo a pena privativa de liberdade aplicada por duas restritivas de direitos, consistente em prestação de serviço à comunidade e limitação de fim de semana pelo prazo da pena substituída, cuja forma de cumprimento será fixada pelo juízo da execução.

Em razão do redimensionamento da pena de Patrícia para quantum inferior a 4 (quatro) anos de reclusão e considerando que ela não exercia qualquer função na Casa do Ancião, não recai sobre a mesma a regra do art. 92, ¿a¿, do CP, e sim a da alínea ¿b¿ do referido artigo que exige pena superior a 4 (quatro) anos

É que para a incidência da referida alínea deve haver uma correlação entre o crime e a atividade exercida pela ré, que, ao contrário dos corréus, não exercia atividade na ¿Casa do Ancião¿, assim, afasto com relação a ela a decretação da perda da função pública.

Com relação à corré DANIELA acompanho o voto do e. Relator.

Nestes termos, com a devida vênia ao e. relator, dou provimento parcial às apelações de Mário Carneiro de Oliveira e de Patrícia Aparecida Mageski e nego provimento a de Daniela Pereira Braga.

É como voto.


DESEMBARGADOR GILBERTO BARBOSA
Acompanho a divergência.