Lei municipal que criminaliza manifestações contra a fé cristã é questionada no STF

O controverso tema da possibilidade de criminalização e punição de crítica religiosa por lei municipal é constitucionalmente relevante, uma vez que envolve ameaça às liberdades fundamentais...

Publicada em 16 de November de 2016 às 15:29:00

A Lei 1.515/2015, do município do Novo Gama (GO), que criminaliza manifestações públicas contra a fé cristã, é alvo de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 431) ajuizada no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. A norma diz que as pessoas envolvidas em atos de discriminação ao cristianismo deverão ser punidas com base no artigo 208 do Código Penal Brasileiro.

A ação afirma que o ato normativo questionado contraria o princípio federativo (artigo 1º, caput), a competência da União para legislar sobre Direito Penal (artigo 22, inciso I), a liberdade de consciência e de crença (artigo 5º, inciso VI), a liberdade de expressão (artigo 5º, inciso IX), a laicidade do Estado (artigo 19, inciso I) e o princípio da isonomia (artigo 5º, caput), todos preceitos constantes da Constituição da República.

Praticar ato que “fira ou afronte a fé cristã”, como prevê a lei municipal questionada, além de ser conceito inadmissivelmente aberto, porque dependente de avaliação completamente subjetiva e variável, não é conduta tipificada como crime no artigo 208 do Código Penal, de forma que a lei municipal inova na ordem jurídica e usurpa competência legislativa privativa da União, em flagrante inconstitucionalidade, sustenta o procurador-geral.

Além disso, o autor da ADPF afirma que não seria aceitável que o poder público, no território do município, agisse para coibir “ferimentos” e “afrontas” à fé cristã e nada fizesse com relação a condutas idênticas em face das fés islâmica, judaica, hindu, budista, taoísta, confucionista, xintoísta, bahaísta ou outras.

O controverso tema da possibilidade de criminalização e punição de crítica religiosa por lei municipal é constitucionalmente relevante, uma vez que envolve ameaça às liberdades fundamentais, aspecto indispensável ao funcionamento da democracia constitucional, afirma o procurador-geral na ADPF. Para ele, “a difusão pública de ideias, mesmo contrárias às religiões, deve ser respeitada por constituir elemento essencial à democracia, ressalvadas apenas a prática da incitação ao ódio e ao cometimento de delitos e, ainda assim, desde que ocorra em face de indivíduos, não de ideias e instituições religiosas ou ideológicas ou de determinado credo”.

Lembrando, por fim, que o STF, em casos emblemáticos, tem conferido especial proteção à livre e plena manifestação do pensamento, no sentido de coibir a censura, o procurador-geral pede a concessão de medida cautelar para suspender a eficácia da norma, ad referendum do Plenário e, no mérito, que seja declarada a incompatibilidade da lei com a Constituição da República.