O ataque de Cunha

Por Andrey Cavalcante

Publicada em 07 de July de 2015 às 16:35:00

O deputado Eduardo Cunha, presidente da Câmara, não consegue esconder sua visão totalitarista. Profundo conhecedor do regimento interno, ele a manobra com desenvoltura para impor sua vontade, ao arrepio da constituição. Considera-se respaldado pela vontade popular para aprovar a redução da maioridade penal mesmo tendo sido derrotado no dia anterior. Agora, quando uma pesquisa da OAB mostra que 74% dos entrevistados são contrários ao financiamento empresarial dos partidos políticos e candidatos, ele vocifera contra a instituição e diretamente contra o presidente Marcus Vinicius Furtado Coêlho. Ou seja: contrariado pela má notícia, ele ataca o portador.

Do alto da notoriedade oferecida pela fragilidade do governo, o parlamentar parece desconhecer o provérbio chinês que adverte: "O medíocre discute pessoas. O comum discute fatos. O sábio discute idéias." Dizer que a OAB não tem credibilidade é fácil para quem possui um palanque permanente na mesa da Câmara Federal. Porque o parlamentar não lê a íntegra da pesquisa destinada justamente a aferir a credibilidade de instituições junto ao público? Ele poderia, assim, perceber que a OAB está muito acima de lideranças messiânicas, totalitárias e absolutamente inconscientes de sua transitoriedade. O financiamento privado, cuja manutenção o deputado insiste em inserir na Constituição, atropelando-a novamente, é um berçário de corrupção.

A verdade é que o presidente da Câmara jamais digeriu o fato de ter sido preterido na relatoria do novo Código Civil por não possuir formação acadêmica adequada: é economista, não advogado. Daí ele ter passado a atacar os exames da ordem, que propõe abolir. Mas é de se duvidar que possa entregar sua defesa a um profissional sem qualificação se tiver que prestar contas à Justiça. O ilustre deputado precisa saber discernir entre a instituição perene e a sazonalidade das pessoas. Ademais, como já disse aqui, o País, nesse momento de dificuldades ou fora dele, não mais comporta o protagonismo político das empresas, que não fazem doações, mas investimentos, esperando retorno na forma de vantagens em contratos junto à administração e outros privilégios ilícitos.

Pior é que Eduardo Cunha nem chegou a ler a pesquisa. Limitou-se a questionar uma pergunta absolutamente imparcial: “Você é contra ou a favor que empresas possam financiar as campanhas de partidos? ”Tivesse lido, saberia que o índice de confiança da OAB em meio à população cresceu 14% no último ano. Numa lista com 14 instituições, a Ordem fica em 2º lugar, só perdendo para as Forças Armadas. Ficou à frente, por exemplo, do Ministério Público, Poder Judiciário, Igreja Católica e imprensa. As três piores posições são ocupadas pela Presidência da República e Ministérios, Congresso Nacional e, por último, partidos políticos.

Sobre a questão da maioridade penal, a nota da direção nacional da Ordem esclarece que “A OAB não deve buscar popularidade, mas, credibilidade. Não será agindo contra a Carta Constitucional que conseguiremos os avanços tão desejados na segurança pública e no sentimento de impunidade. Nós, como advogados, não podemos enfraquecer nossa lei maior. Não podemos aceitar que um processo legislativo contrário à Constituição seja efetivado com base no desejo da maioria. Defendemos diversas mudanças em leis que podem ser alteradas. Queremos ampliar o tempo de internação de menores, queremos penas mais duras para adultos que usam crianças e adolescentes para crimes. Queremos que a educação seja garantida, que crimes sejam punidos. Mas não queremos que a Constituição seja dilacerada para isso. Não estamos do lado de maiorias ocasionais. Nosso lado é o da Constituição da República.

Convém ressaltar o que disse o ex-ministro do STF, Carlos Ayres Britto, para quem a fixação da maioridade penal em 18 anos é cláusula pétrea da Constituição e que o Supremo pode fazer uma análise “principiológica” do caso, como já fez em grandes temas recentemente.E acrescenta que mesmo no aspecto formal da votação na Câmara, a aprovação posterior da emenda rejeitada do dia anterior pode ser causa para anulação da sessão. É exatamente o pensamento da OAB, sem qualquer vinculação ao comportamento da esquerda, de minorias ou partidos nanicos e políticos em busca de holofotes.