Rondônia: Auditora fiscal que apresentou diploma falso perde o cargo

De acordo com o MP, ao tomar posse, ela apresentou diploma de conclusão de curso superior em Administração, supostamente emitido pela Universidade Católica do Paraná.

Publicada em 15/08/2011 às 11:26:00

Da reportagem do TUDORONDONIA

Porto Velho, Rondônia – A juíza Inês Moreira da Costa, da 1ª Vara da Fazenda Pública, julgou integralmente procedente a ação cível de improbidade administrativa impetrada pelo Ministério Público de Rondônia contra a auditora fiscal de tributos estaduais Salete Leopoldina Shadeck e a condenou à perda do cargo público, suspensão dos direitos políticos por quatro anos e pagamento de multa cível no valor de 20 vezes sua remuneração. Cabe recurso da decisão.

Segundo a denúncia do Ministério Público, a auditora fiscal cometeu, no ano de 2002, ato de improbidade administrativa, “vilipendiando princípios da Administração Pública, máxime os da legalidade, moralidade e lealdade, porquanto apresentou diploma universitário falso com vistas a obter investidura no cargo público de Auditora Fiscal de Tributos Estaduais”.
De acordo com o MP, ao tomar posse, Salete apresentou diploma de conclusão de curso superior em Administração, supostamente emitido pela Universidade Católica do Paraná. Todavia, referida instituição de ensino informou jamais ter expedido tal diplomação, a auditora pessoa estranha ao quadro de ex-alunos.

“Tem-se, realmente, que a investidura de ré ocorreu de maneira irregular, e ardilosa, porquanto utilizou diploma falso para preencher o requisito de escolaridade exigida para o cargo de auditor, fato esse que consubstancia ato ímprobo na modalidade violação aos princípios da Administração Pública”, anotou a juíza na sentença.



ÍNTEGRA DA DECISÃO




Vara: 1ª Vara da Fazenda Pública
Processo: 0021693-05.2010.8.22.0001
Classe : Ação Civil Pública
Requerente: Ministério Público do Estado de Rondônia
Requerido: Salete Leopoldina Schadeck
SENTENÇA
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA ajuizou ação civil pública por ato de improbidade administrativa, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, em face de SALETE LEOPOLDINA SHADECK.
Assevera que a ré cometeu, no ano de 2002, ato de improbidade administrativa, vilipendiando princípios da Administração Pública, máxime os da legalidade, moralidade e lealdade, porquanto apresentou diploma universitário falso com vistas a obter investidura no cargo público de Auditora Fiscal de Tributos Estaduais.
Informa que ao tomar posse, a ré apresentou diploma de conclusão de curso superior em Administração, supostamente emitido pela Universidade Católica do Paraná. Todavia, referida instituição de ensino informou jamais ter expedido tal diplomação, sendo a ré pessoa estranha ao quadro de ex-alunos.
Assim, pontua que a investidura da ré é nula de pleno direito, já que o ato administrativo foi praticado sem o preenchimento dos requisitos legais previstos na Lei estadual 1.052/2002.
Pede seja declarada nula a investidura da ré para aplicar-lhe as sanções do art. 12, inc. II, da Lei 8.429/1992, condenando-a à perda do cargo público, suspensão dos direitos políticos e ao pagamento de multa civil de vinte vezes sua remuneração.
Devidamente notificada, a ré apresentou defesa preliminar. A despeito disso, por haver indícios de conduta passível de ser imputada ímproba, a petição inicial foi recebida e determinado a citação para apresentar contestação (fl. 66).
Contestação ofertada às fls. 88/100, na qual a ré alegou prescrição e, no mérito, sustentou, em síntese, não ter havido efetivo prejuízo à Administração.
Réplica às fls. 132/134.
Intimadas as partes para especificação de provas, o autor pugnou pelo julgamento antecipado da lide, ao passo que a ré quedou-se inerte (fl. 131-v).
É o relatório.
DECIDO.
A lide comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 330, I, do CPC, porquanto prescinde de produção de provas em audiência, sendo certo que os elementos coligidos nos autos dão suporte ao desfecho seguro da demanda e, não bastasse isso, as partes não se manifestaram quanto à especificação de provas, destacando-se que a ré quedouse inerte.
PREJUDICIAL DE MÉRITO
Inicialmente, urge analisar a preliminar de prescrição.
Nesse particular, como já dito, a questão posta à apreciação revela ação de natureza declaratória com vistas a atestar nulidade de ato administrativo, porquanto teria a ré obtido investidura em cargo público mediante uso de diploma falso.
Portanto, estaria o ato administrativo que procedeu à investidura da ré inquinado de nulidade, porque teria ingressado em cargo público sem o requisito necessário de escolaridade exigida. Se se trata de ação declaratória, a pretensão é imprescritível.
Ademais, ainda que aceitando que poderia a ré constituir validamente a relação jurídica com a Administração Pública, tecnicamente se estaria falando de decadência e, nesse cenário, tem-se que, salvo comprovada má-fé, o direito de anular os atos administrativo de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos.
Portanto, conforme já decido quando do recebimento da ação, REJEITO a preliminar de prejudicial de mérito.
MÉRITO
No que concerne à questão de fundo, extrai-se dos autos que razão assiste ao parquet.
Como observado, “conquanto fosse ônus da ré a impugnação específica dos fatos alegados na petição inicial (CPC, art. 302), esta sequer mencionou em seu contestação a alegação de uso de documento falso e o fato de não possuir ensino superior” Com efeito, ao que se observa da resposta à inicial, a ré não demonstra nenhum fato
desconstitutivo da pretensão veiculada na peça de ingresso. É dizer: em nenhum momento demonstrou que, à época da investidura no cargo de Auditor Fiscal do Estado de Rondônia, preenchia o requisito de escolaridade exigida para tanto.
Limitou-se a ré a pontuar que inexiste efetivo prejuízo à Administração, asseverando que cumpre todas as atribuições inerentes ao cargo que ocupa com competência, eficiência, disciplina e assiduidade.
Semelhante argumento é irrelevante, não sendo suficiente para afastar a irregular investidura no cargo público de Auditor Fiscal, que ficou devidamente comprovada. A propósito, nem convém discutir a ausência de prejuízo ao Estado, porquanto o ato ímprobo imputado consiste na violação aos princípios da Administração.
Além de não demonstrar nenhum fato desconstitutivo da pretensão inicial, mesmo porque não haveria como, é dos autos que a ré não preenchia a escolaridade exigida para o cargo de auditor fiscal.
Em setembro de 2001 foi deflagrado, por meio do edital n. 145/CDRH, concurso público para provimento do cargo de Auditor Fiscal de Tributos Estaduais, para o qual se exigiu diploma de curso de graduação em cursos de Contabilidade, Administração, Economia ou
Direito. A ré classificou-se em 35º lugar (fl. 37), apresentando à SEFIN diploma universitário de graduação no curso de Administração, emitido pela PUC/PR (fl. 42).
No entanto, a própria instituição de ensino informou que “não constam nos registros oficiais desta Instituição, dos nomes do Sr. Emerson Francisco Kezne e da Sra.
Salete Leopoldina Sehadeck como ex-alunos da PUCPR, muito menos no Curso de Administração. (fl. 21)
Portanto, incontroverso que a ré não possui investidura válida no cargo de Auditor Fiscal, tendo em vista que o diploma apresentado para tomar posse (fl. 18) não foi emitido pela PUCPR.
Assim, tem-se que a ré usou documento falso para ingressar no quadro de pessoal permanente do Estado de Rondônia, sendo ilegítimo e nulo de pleno direito o vínculo com a Administração Pública, afronte aos princípios da legalidade, moralidade e lealdade.
HELY LOPES MEIRELES (in, "Direito Administrativo Brasileiro", RT, SP, 12a. edição, p. 132), bem obtempera que:
"Ato nulo é o que nasce afetado de vício insanável por ausência ou defeito substancial em seus elementos constitutivos, ou no procedimento formativo. A nulidade pode ser explícita ou virtual. É explícita quando a lei comina expressamente, indicando os vícios que lhe dão origem; é virtual quando a invalidade decorre da infringência de princípios específicos do direito público, reconhecidos por interpretação das normas concernentes ao ato. Em qualquer destes casos, porém, o ato é ilegítimo ou ilegal e não produz qualquer efeito válido entre as partes, pela
evidente razão de que não se pode adquirir direitos contra a lei." - grifei.
A guisa de ilustração, note-se o seguinte julgado do STJ:
"ADMINISTRATIVO - RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA -
INVESTIGADOR DE POLÍCIA CIVIL - APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTO
CONSIDERADO FALSO (CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DE 2º GRAU) – NÃO
PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO EDITAL - NOMEAÇÃO ANULADA -
DEMISSÃO - POSSIBILIDADE - INDEPENDÊNCIA ENTRE ESFERA
ADMINISTRATIVA E CRIMINAL - LEGALIDADE - AMPLA DEFESA E
CONTRADITÓRIO OBSERVADOS - AUSÊNCIA DE LIQUIDEZ E CERTEZA A
AMPARAR A PRETENSÃO.
1 - Ante a evidência de fraude na inscrição do recorrente em Concurso Público, mediante a utilização de documento considerado falso, consoante comprovação produzida pela autoridade coatora, deve a Administração Pública anulá-la, em observância aos princípios da moralidade, legalidade e impessoalidade dos atos administrativos.
Vislumbrada a lesão ao erário público, não podendo esse ato ser convalidado, diante da situação irregular do candidato aprovado e nomeado, o Administrador tem o poderdever de revê-lo, posto que se o candidato que o praticou buscou uma finalidade alheia ao interesse público, diversa da prescrita em lei - no caso concreto, edital -,
usando-o em benefício próprio, tal ato é inválido, uma vez que eivado de vício de nulidade desde o nascedouro, não acarretando qualquer direito subseqüente a seu beneficiário (cf. Precedentes - RMS nºs 52/MA e 7.688/RS, ambos desta Corte e RE nº 85.557, do STF).
(...)
3 - Recurso conhecido, porém, desprovido."(ROMS 11.668-RS, Rel. Min. Jorge
Scarterzzini, DJ de 18.02.2002).
Em razão da má-fé da ré tem-se caracterizado o ato ímprobo, porquanto sua conduta
antijurídica feriu os princípios da Administração Pública, em nítida desonestidade com a
Administração.
Tem-se, realmente, que a investidura de ré ocorreu de maneira irregular, e ardilosa,
porquanto utilizou diploma falso para preencher o requisito de escolaridade exigida para
o cargo de auditor, fato esse que consubstancia ato ímprobo na modalidade violação aos
princípios da Administração Pública, consoante a dicção do art. 11 da Lei 8.429/1992,
impondo-se, por conseguinte, as sanções do inciso III do art. 12 da mesma Lei.
DA TUTELA ANTECIPADA
É certo que a tutela antecipada pode ser concedida em qualquer momento, inclusive quando da prolação da sentença.
Na espécie, verifique-se que houve deferimento em parte da tutela antecipada, determinando apenas o afastamento da ré de suas funções, porém continuou recebendo a remuneração inerente ao cargo de Auditor Fiscal. Após análise exauriente dos autos, ficou evidenciado que realmente a ré ocupa cargo público para o qual não preenche o requisito de escolaridade, tendo apresentado ardilosamente diploma falso.
Sendo assim, impõe-se a confirmação da tutela antecipada, inclusive na extensão pretendida pelo parquet. Portanto, reexaminando o pedido de tutela antecipada, determino ao Estado de Rondônia, por intermédio da SEFIN, que, afora o afastamento, proceda à suspensão da remuneração da ré.
Dispositivo
Ante o exposto, confirmo a antecipação dos efeitos da tutela e JULGO INTEGRALMENTE PROCEDENTE o pedido articulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA em face de SALETE LEOPOLDINA SHADECK, para DECLARAR NULA a investidura da ré no cargo de Auditor Fiscal de Tributos Estaduais, bem como CONDENÁ-LA: a) à perda do cargo público, b) à suspensão dos direitos políticos por quatro anos, c) ao pagamento de multa civil no valor de vinte vezes sua remuneração, a ser revestida em favor do Fundo de Direitos Difusos. Custas de lei. Sem reexame necessário. P.R.I.C.
Porto Velho-RO, quinta-feira, 11 de agosto de 2011.
Inês Moreira da Costa
Juíza de Direito