Operação Dominó: Leia trecho da sentença que condenou o ex-deputado estadual Edézio Martelli a 10 anos de prisão

... esse condenado desviou dos cofres da ALE/RO, em proveito próprio e de terceiros, R$ 462.525,28.

Publicada em 08 de July de 2016 às 09:16:00

III - 18. Condenado Edézio Antônio Martelli.
A culpabilidade (lato senso), entendida, agora, como o juízo de reprovabilidade
social dos fatos/condutas e dos seus autores, relativamente a esse sentenciado, revela-se
acentuada. Edézio, na condição de deputado estadual, tinha a obrigação de zelar pela
integridade do Erário e não, em conluio com os corréus, especialmente com 'Carlão de
Oliveira', utilizá-lo em prol do seu interesse particular e de terceiros. Restou comprovado (v.
item II - 3.1.17, supra) que esse sentenciado incluiu 21 (vinte e uma) pessoas na citada
'folha paralela', entre os anos de 2004/2005, em nome das quais foram emitidos chequessalário,
mês a mês, cujos valores foram desviados por ele (Edézio), em proveito próprio e
alheio. Os cheques foram retirados do Departamento Financeiro da ALE/RO pelo próprio
acusado ou por seus prepostos. Interessa consignar, ainda, que na famigerada 'folha
paralela' figuravam nomes de pessoas de boa fé, que buscavam empregos públicos e
tiveram seus nomes inseridos, indevidamente, em cheques de pagamentos, sem ter
prestado qualquer tipo de serviço à ALE/RO e serem beneficiadas com os respectivos
valores, os quais foram desviados. Com o seu proceder Edézio maculou de forma indelével
a nobreza do cargo que exercia na estrutura organizacional deste Estado, desmoralizando
o Poder Legislativo e o próprio Estado de Rondônia. Traiu a Administração, ferindo
mortalmente seus principais princípios, e o povo rondoniense, especialmente as centenas
de eleitores que lhe outorgaram o mandato de deputado estadual, para locupletar-se do
dinheiro público e beneficiar a si e a terceiros. Além de ser politicamente beneficiado, teve
grande vantagem patrimonial com o esquema criminoso, conforme acima destacado. O
conteúdo da sua culpabilidade não pode ser equiparado ao de um servidor público
qualquer, que eventualmente comete crime de peculato, por se apropriar ou desviar, em
proveito próprio ou alheio, bem de pequeno valor para o Estado.
A propósito, sobre a 'culpabilidade', como fator referencial para a fixação da pena
base, orienta a doutrina (v. Código Penal e sua Interpretação, Alberto Silva Franco e
Outros, RT, 8ª Edição, 2007, pág. 343:
"(...) o legislador de 84, quando introduziu a 'culpabilidade' entre os indicadores de
que o juiz deve valer-se para determinar a pena a ser em concreto imposta ao
agente, não efetuou uma mera substituição da locução 'intensidade do dolo e grau
de culpa'. Com maior apuro técnico e, guardando coerência com os princípios
basilares que informaram a reforma da Parte Geral, excluiu o dolo e a culpa, como
fatores aferíveis na individualização da pena porque um e outra, desprovidos de
toda e qualquer qualificação, estão inseridos na atividade típica final. Isto não
significa, no entanto, que o conceito de culpabilidade esteja imune a uma graduação
como Jescheck (ob. Cit. p. 1.209-1.210), numa página exemplar de sua obra,
demonstrou de forma extremamente límpida: 'Os motivos e metas do réu, a atitude
interna que se reflete no delito, o grau de contrariedade ao dever são todas as
circunstâncias que fazem aparecer a formação de vontade do réu numa luz mais ou
menos favorável, agravando ou atenuando, com isso, o grau de reprovabilidade do

delito. Entre os motivos do crime, distinguem-se os estímulos externos (p. ex.:
situação de necessidade econômica, paixão política, coação) dos motivos internos
(p. ex.: ódio, ânimo de lucro, paixão). Em ambos os grupos, o que importa para a
determinação da pena é verificar o grau de força do motivo e indagar seu valor
ético. Deve investigar-se também a qualidade ética das metas que o réu persegue.
Existe uma diferença importante para o conteúdo da culpabilidade do delito entre a
conduta do médico que dá ao moribundo uma dose excessiva de morfina para
libertá-lo de suas dores e a do hipócrita herdeiro que faz o mesmo para impedir que
o enfermo modifique seu testamento antes de morrer. A atitude interna do réu não
deve equiparar-se com seu caráter, mas, sim, estender-se como um atual pensar
referido ao fato concreto, tanto na formação da vontade, como na execução do
delito (ex.: uma vileza insuperável ao matar os pais, reprovável atitude interna de
um estelionatário habitual, indigna atitude de distanciar-se do lugar do acidente).
Também a atitude interna do réu deve ser valorada segundo as normas da ética
social (p. ex.: atitude negativa a respeito do bem jurídico protegido, escassa
reprovabilidade do delito ante circunstâncias externas, caráter neurótico, erro de
proibição, situação emocional-limite ou transtorno mental agudo). Todas essas
valorações devem ser feitas conforme a consciência valorativa da comunidade, e
não conforme as idéias morais do juiz ou de uma doutrina ou tendência filosófica
determinada. De todos os modos, não é possível uma determinação da pena no
atual direito vigente sem recorrer a critérios morais. Finalmente, deve ter-se em
conta para o conteúdo da culpabilidade do fato o grau de contrariedade do dever,
que se inclui especialmente na determinação da pena nos delitos culposos".
(destaquei).
Oportuna também é a orientação do Ex-Ministro Joaquim Barbosa, do E. STF,
quando, ao tratar da culpabilidade dos condenados na Ação Penal 470, referiu que a
culpabilidade deles não deveria ser equiparada a de um 'guardinha', que, em troca de
propina, 'alivia' um condutor que desrespeita regras de trânsito.Tratando-se de servidores
(sentido lato) de alto escalão da Administração, a conduta delituosa é muito mais
reprovável, devendo, por conseguinte, balizar a pena base.
Volvendo às demais circunstâncias judiciais, verifico que esse condenado, de
acordo com as certidões acostadas aos autos e confirmação no SAP/TJRO, não registra
antecedente criminal negativo, entendido este como sentença penal condenatória
transitada em julgado, haja vista o princípio constitucional da presunção de inocência. No
entanto, tem outras ações penais em curso por crimes de peculato e fraude a licitação,
além de estar respondendo por atos de improbidade administrativa, o que, somado às
circunstâncias dos fatos apurados nestes autos, denuncia personalidade desvirtuada e
demonstra má conduta social. As consequências são desfavoráveis porque ficou
comprovado (v. item II - 3.1.17, supra) que esse condenado desviou dos cofres da ALE/RO,
em proveito próprio e de terceiros, cerca de R$ 462.525,28 e não há comprovação nos
autos de que o valor desviado tenha sido restituído, persistindo grande prejuízo de ordem
material, sem contar com o dano à imagem do Poder Legislativo Estadual e também do
próprio Estado de Rondônia, frente aos demais Estados da Federação. As demais
circunstâncias judiciais integram a própria tipicidade dos delitos de peculato-desvio e
formação de quadrilha.
Desta forma, ponderadas as circunstâncias judiciais, com destaque negativo para a
acentuada culpabilidade, a personalidade desvirtuada e a má conduta social, bem como

para as consequências desfavoráveis e, considerando, ainda, a elasticidade do preceito
secundário do artigo 312, do Código Penal (a pena varia de 2 a 12 anos de reclusão), fixo a
pena-base, de cada crime de peculato/desvio, em 05 (cinco) anos de reclusão + 50
(cinquenta) dias multa, e a pena-base do crime de formação de quadrilha em 02 (dois) anos
e 02 (dois) meses de reclusão, penas estas que torno definitivas, em relação a cada crime.
Na forma do artigo 71, caput, do Código Penal, relativamente aos crimes de
peculato-desvio, aplico tão somente a pena de um desses crimes (são idênticas),
aumentada de 2/3 (dois terços), totalizando parcialmente a sanção em 08 (oito) anos e 04
(quatro) meses de reclusão + 83,33 dias multa.
Esclareço que efetuei a exasperação máxima, levando em consideração o número
de crimes concorrentes. Restou comprovado (v. item II - 3. 1.17 - supra) que a citada folha
paralela vigorou de junho de 2004 a junho de 2005, com multiplicidade de crimes de
peculato-desvio (os desvios seguiam mês a mês), e que esse sentenciado incluiu nela 21
(vinte e uma) pessoas, sendo por ele desviado o montante de R$ 462.525,28.
Atento ao artigo 69, do Código Penal, somo a pena decorrente do concurso de
crimes de peculato-desvio com a pena do crime de formação de quadrilha totalizando
definitivamente a sanção em 10 (dez) anos e 06 (seis) meses de reclusão + 83 diasmulta,
pena esta que entendo necessária e suficiente para prevenção e reprovação dos
crimes cometidos.
Ante a condição econômica desse sentenciado, fixo o valor do dia-multa em 01 (um)
salário mínimo, valor vigente ao tempo dos fatos, devendo ser atualizado, quando da
execução, pelos índices de correção monetária, nos termos do artigo 49, §2º, do Código
Penal.
O regime inicial para o cumprimento da pena privativa de liberdade será o fechado
(CP, art. 33 § 2º 'a' c/c § 3º), porque a pena total imposta é superior a 08 (oito) anos.
Deixo de substituir a privação da liberdade por penas restritivas de direitos porque
esse condenado não preenche os requisitos legais (CP, art. 44, I e III), ou seja, porque a
pena aplicada é superior a 04 (quatro) anos e existem circunstâncias judiciais
desfavoráveis.
Pelas mesmas razões não pode ser concedida a suspensão condicional da pena, ex
vi do artigo 77, do Código Penal.